Nestes 15 anos em que trabalho na preparação e aprimoramento de atores, percebi as dificuldades e as dúvidas tão comuns àqueles que almejam e atiram-se na carreira de ator.
Todos temos sonhos e ser ator pode parecer uma vida de louros, um acerto na loteria, que garante fama, dinheiro e vida boa. Ledo engano! Essa pode ser a aparência para quem vê a profissão de fora, mas ser ator é optar por uma das carreiras que exigem maior dedicação, esforço e perseverança, ou seja, tem que suar muito a camisa.
E para aqueles que não gostam de ler, melhor desistir logo aqui! Ator que não lê, fica só no projeto; nunca saiu do início e sempre terá cultura extremamente limitada, o que é incompatível com qualquer artista, sobretudo com o ator. Até porquê, o ator é um profissional que estuda pra sempre. Não existe um 'estou pronto'. Por trabalhar com composição, criação e construção, uma eterna preparação é necessária, pois sempre há algo a aprender e que ele vai precisar para este ou para aquele personagem. Aliás, por ser um trabalho de constante autoconhecimento, quem pode dizer que já sabe tudo sobre si mesmo? Que dirá de uma outra personalidade que se propõe a construir!
O caminho é árduo, mas não precisa ser sofrido. Costumo dizer para meus alunos que eles optaram por uma profissão que, apesar de ser uma constante "ralação", há vantagens maravilhosas para aqueles que realmente sentem prazer no que fazem. Por exemplo, o ator geralmente não tem uma rotina fechada. E se tem, não é por muito tempo. O ator de TV, por exemplo, nunca pode reclamar de uma rotina, pois ele está sempre trabalhando cenas diferentes e fazendo coisas diferentes, em dias diferentes, horários diferentes e lugares e cenários diferentes. Além do mais, você recebe um salário para realmente fazer o que gosta, o que significa ganhar para se divertir. Obviamente, isso depende de como você encara sua profissão.
Agora, para chegar neste ponto, é preciso estudar e ser um bom ator. Quando você se acostuma a estudar sempre, tem sempre algo novo a oferecer e os diretores adoram atores que fogem das mesmice em seus personagens; gostam que o ator esteja sempre lhes mostrando possibilidades e para isso, o ator precisa estar sempre se aprimorando, explorando seus limites, buscando ir além do que supõe ser capaz de fazer.
Pensando nisso, baseado em minha metodologia de trabalho no aprimoramento de atores para a interpretação em TV e Cinema, desenvolvida em torno de 10 anos de pesquisas e laboratórios com meus próprios alunos, separei algumas dicas que, apesar de serem generalizantes e escaparem um pouco da realidade de que existe uma necessidade de trabalho personalizado, de acordo com as necessidades particulares de cada ator, já servem como base e baliza de como se deve começar a trajetória. Vamos a elas...
Dica 1
Não corra com o texto. A maioria dos atores, mesmo alguns que já tem certa projeção, tem um desespero em terminar logo o texto. Ora, se o texto é para ajudar o ator e uma ferramenta essencial, você vai jogá-lo fora desta maneira? É praticamente impossível ter uma boa interpretação, correndo com o texto, pois não sobra espaço nem tempo para nuances essenciais à qualidade na interpretação. Pense antes de falar. Isso nos leva a próxima dica.
Dica 2
Aprenda a trabalhar com pausas no texto. Mas lembre-se que pausa não é buraco; há sempre interpretação e, muitas vezes, você interpreta mais numa pausa do que no texto propriamente dito. Há pessoas que afirmam que as pausas tiram sua espontaneidade. Na verdade, há um equívoco nesta forma de ver as coisas. A pausa bem colocada e habilmente utilizada não tira sua espontaneidade, apenas elimina a impulsividade, que sempre é ruim para o ator, visto que significa ele sair da técnica e arriscar intuitivamente, o que pode dar certo uma vez e errado em outra; quando optando pela técnica, ele quase sempre terá 100% de chance de acerto. Além do mais, ao optar pela impulsividade, a compreensão do texto para quem assiste, quase sempre fica truncada e difícil, pois o ator atropela as palavras e quase emenda umas nas outras.
Lembre-se: Espontaneidade não é o mesmo que impulsividade. A primeira é positiva, já a segunda...
Dica 3
Postura. Não fique balançando, "sapateando", subindo e descendo das pontas dos pés ou jogando o corpo para a frente nos momentos de maior intensidade na interpretação. Isso enfraquece seu personagem e deixa louco qualquer camera-man. Também não há espaço para um ator curvado, que parece um corcunda, né? A não ser que você realmente esteja fazendo o papel de um corcunda.
Dica 4
Expressão. Você tem 30 músculos divididos em grupos no seu rosto. Use-os! A expressão é fundamental e faz parte do conjunto durante a interpretação. Não adianta sua voz estar super trabalhada e o rosto parecendo um boneco de cera. A expressão deve acompanhar aquilo que você quer transmitir. No início, para perceber se está passando o que quer através da expressão e para regular a intensidade, grave-se com o celular ou uma câmera. Um espelho também pode ser uma opção, mas não transforme isso num hábito, pois você não poderá usar um espelho na cena. É somente no início, para desenvolver a consciência do que está fazendo e eliminar os exageros.
Dica 5
Emoção. Há uma história a ser contada, através de um personagem e, para isso, o ator precisa ser o transmissor desta história. Então, procure sempre entender bem o texto, o que está nas entrelinhas, o porque de ele estar falando aquilo e de tal e qual maneira. Chamamos isso de subtexto, ou seja, o texto que está por trás e justifica o tom de sua interpretação. A emoção é resultado de um trabalho de autoconhecimento constante. E não adianta usar as expressões, se você não está sentindo nada. E se você estiver sentindo, as expressões serão naturalmente o resultado disso.
Há formas tradicionais, que levam mais tempo de concentração, usando memória emocional etc. e há as formas técnicas. No decorrer de 10 anos de pesquisas, desenvolvi técnicas exclusivas para que se chegue às emoções, sem que se perca qualidade, mas isso demanda trabalho, dedicação e constante auto-observação, para que o ator descubra seus próprios caminhos internos que o levarão a utilizar-se da emoção quase instantaneamente, quando precisar. Este é um trabalho que venho desenvolvendo com resultados muito positivos através do coaching.
Uma coisa é certa: sem emoção adequada, sua interpretação naufraga, seja por exagero ou por insuficiência.
Dica 6
Fé cênica. Se você não acreditar no que você está fazendo, se não for real para você, certamente não será para quem estiver assistindo. Para facilitar esse processo ao qual chamamos de fé cênica, procure trazer o texto para sua realidade. Obviamente, você não é o personagem, mas se você estivesse passando por uma situação daquelas e tivesse que falar aquelas palavras, como seria? Faça você mesmo, dentro da situação da cena. É uma ótima forma de começar a construir seu personagem, com naturalidade e de forma convincente para quem está assistindo. O que é mais natural do que ser você mesmo? Depois disso, você se preocupa com a composição, que dará características reais e mais a ver com o personagem.
Dica 7
Quarta Parede. Todo ator dedicado e estudioso já ouviu falar neste termo. Chamamos quarta parede, a parede imaginária que existe entre o ator e o público. Por que ela é importante? Sua imaginação é que dá a possibilidade do ator criar um espaço cênico, que será uma outra realidade, a realidade do personagem e da história. Conseguir, de certa forma, isolar-se da realidade externa, dentro da realidade cênica é meio caminho andado para o sucesso no que se está propondo fazer. A cena é o que importa e ela precisa ser o mais próximo possível do real, sem colocar os atores em perigo, obviamente.
Dica 8
Nervoso. Todo ator fica nervoso, seja numa estréia, seja minutos antes de começar a peça, gravação ou filmagem. Se algum ator diz que não, certamente está mentindo. Sempre rola aquele friozinho na barriga, na região do estômago. É, no mínimo, a ansiedade de querer fazer logo. Isso sempre significa uma coisa: excesso de energia. Se você não sabe aproveitar esta energia, transferindo-a para a interpretação, o melhor é pegar o excesso dela e espargi-la, joga-la fora! Para isso, antes da peça, faça abdominais, pulinho chinelo, corra etc.
Dica 9
O Olhar. Todo mundo já ouviu o velho ditado de que "os olhos são o espelho da alma". Não há maior verdade! Os olhos passam aquilo que estamos realmente sentindo e não adianta nada você fazer tudo e ficar com aquele olhar de peixe morto. Na mesma hora, quem estiver assistindo, perceberá que sua interpretação é artificial. Para ser convincente, tem que ser o mais próximo da realidade possível, então trate de passar a emoção pelo olhar. Se você não tiver fé cênica, é quase certo de que não passará verdade pelo olhar.
Dica 10
Observe os atores consagrados. Observar quem sabe e faz bem, ajuda e muito no teu aprimoramento. Mas tem que saber o que observar! Preste atenção em como eles brincam com as palavras, mudam de tom, trabalham as pausas, a intensidade, a velocidade e o volume. Tudo isso em conjunto com as expressões e a emoção, porque não estão simplesmente fazendo uma cena, mas vivendo-a! Ator é por si só um grande observador. Se você não é um observador, trate de se tornar um, pois o ator aprende muito observando os outros.
Ficam aí, as minhas 10 dicas. É claro que tudo isso não é tão fácil assim e exige muito estudo, dedicação e um bom profissional habilitado em trabalhar com todos estes elementos. Além do mais, cada ator tem suas demandas, o que requer um trabalho praticamente personalizado, para se obter resultados satisfatórios. É sempre necessário que alguém de fora, capacitado e atencioso esteja balizando os passos do ator, para que assim, ele consiga realmente progredir e aprender a caminhar sozinho.
Sucesso e muita LUZ sempre!
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